LIBERDADE


"Aqui nesta praia onde não há nenhum vestígio de impureza, aqui onde há somente ondas tombando ininterruptamente, puro espaço e lúcida unidade, aqui o tempo apaixonadamente encontra a própria liberdade."

Sophia de M. B. Andresen

domingo, 21 de abril de 2013

COBRA CIPÓ

Por
Mércia Carvalho

Depois de quase dois meses de andanças entre “Europa, França e Bahia” – como bem diz o poema de Carlos Drummond de Andrade – a minha mãe andarilha, Ody Carvalho, estava de volta a sua casa. Saudosa, mas pronta para outra voltinha - ela é igual a uma menina andeja, para onde você chamar ela vai, contanto que saia de casa.
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Aproveitando o feriado do Dia das Crianças, convidei-a para matar a saudade da nossa querida Papary.  Lá fomos nós: Mamãe, Lina, Léo e eu fazermos um “tour” para, além das fofocas da viagem, saborear algumas das delícias da nossa terra – ela disse que passou fome na maior parte da viagem pelo velho continente, chegando a perder alguns quilinhos, façanha que aqui, mesmo com orientação nutricional ela não consegue.
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Fomos até a nossa casa na Praia de Barreta – onde de cara mamãe comprou cocadas de coco somente para “ajudar” a um velho conhecido - e voltamos por Nísia Floresta para almoçarmos – camarão e galinha caipira - no restaurante de Vavá onde a comida gostosa e caseira, além do ambiente arborizado, nos deixa com vontade de ir ficando por lá comendo e fofocando ao sabor da sombra e do vento.
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Terminada a comilança lá vínhamos nós, todos de barriga cheia. Mamãe saboreando disfarçadamente as suas cocadas, Léo cochilando, Lina tagarelando e eu dirigindo, a 100 quilômetros por hora, apreciando a paisagem, quando de repente ao olhar a minha esquerda, na janela do meu carro, lá estava ela me olhando. A princípio não acreditei.  Olhei novamente e soltei um grito de horror:
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- Uma cobraaaaaaaaaaaaaaa!
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Meu grito foi tão grande e pavoroso que Leo acordou de supetão, saindo dos braços de Morfeu, perguntando:

- Aonde? Aonde?

Lina pinotou para o colo de mamãe sentando em cima das cocadas. 

Mamãe, calmamente, continuou no seu lugar e disse:

- Feche a janela, se fosse um sapo eu estaria morrendo de medo, mas, uma cobra...

E eu, apavorada, com um olho na estrada e outro na cobra, tentando achar a maçaneta da porta e dirigindo quase sentada em cima da alavanca de macha, até conseguir fechar o vidro – nessas horas é que você vê o quanto é bom ter um carro com vidro elétrico.
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Continuamos a viagem. O carro todo fechado, com o ar condicionado ligado e aquela cobra presa na porta pelo rabo. Eu olhando para ela e ela para mim, até a porta da casa de Léo, quando descemos pelo lado oposto em disparada.
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O alarde do mulheril foi tamanho que lá veio o vizinho com uma enxada para matar a cobra. E Léo, entre a sobriedade e a demência dizia acariciando a danada:
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- Coitada, é somente uma cobra cipó! Deixe que mamãe cria... 

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